*Ozires Pereira de Oliveira
As relações trabalhistas no Brasil, em alguma medida, foram marcadas pela luta de classes, aprofundando a visão de incompatibilidade de objetivos. Neste sentido, as chefias e a hierarquização das estruturas organizacionais cumpriram, entre outras funções, o papel importante de harmonizar os interesses dos empregadores e funcionários.
Nesses últimos tempos, observamos claramente um movimento para privilegiar um modelo de gestão que estabelece a qualidade de vida e o alinhamento de propósitos como pilares centrais para a redução dos índices de turnover, retenção de pessoas e melhoria do desempenho. Parece evidente que o futuro das organizações e a sua necessária sustentabilidade estão cada vez mais atrelados à mudança dos velhos paradigmas da administração.
A questão é que, no início de 2020, fomos surpreendidos pelas mudanças repentinas impostas pelo alerta da OMS (Organização Mundial de Saúde) de pandemia mundial, o que, de alguma forma, pode apontar para uma eventual ruptura no processo de construção e mudança da cultura organizacional. Existem hoje muitas dúvidas sobre a capacidade das empresas em manter o engajamento e a clareza de propósito de seus colaboradores, considerando o novo modelo de trabalho, seja ele híbrido, remoto ou presencial.
A crise sanitária que sucedeu o alerta evidenciou várias incertezas no que diz respeito à manutenção da vida, da saúde e do emprego, entre outros fatores, descortinando uma triste realidade já apontada pelo mesmo organismo internacional sobre ansiedade – relatório da OMS em 2019 aponta que o Brasil sofre uma epidemia de ansiedade: são 18,6 milhões de pessoas diagnosticadas, o que coloca o país em primeiro lugar no mundo.
Esse cenário instável pode ampliar a sensação de insegurança nas organizações e prejudicar de maneira significativa a conduta dos times, afetando gravemente o resultado global.
É evidente que temos um desafio de proporções ainda não conhecidas, por isso é essencial que o foco de colaboradores e empregadores seja direcionado para estreitar as relações de confiança e respeito mútuos, pensando na manutenção de entregas e postos de trabalho, tão necessários devido à crise econômica que veio na esteira da Covid-19.
Obviamente, confiança é uma palavra singular, está carregada de significação e certamente é construída ao longo do tempo. Além disso, requer um alto grau de responsabilidade e consciência do papel de cada um dentro do contexto atual. As relações saudáveis no ambiente corporativo dependem necessariamente do grau de maturidade desse processo de confiança, seja em tempos de pandemia ou de normalidade.
Dito de outra maneira, independentemente do modelo de trabalho, será necessário compreender a interdependência entre as lideranças e as equipes, atitudes e posicionamentos, bem como o seu impacto nos resultados da empresa. Eu costumo dizer que a sustentabilidade é circular, ou seja, temos o compromisso de aportar sempre para que a estabilidade da “nossa empresa” seja duradoura.
O meio corporativo e empresarial cumpre papel extremamente importante no enfrentamento dessa crise que estamos atravessando. Em meio a esse cenário, observamos algumas empresas incríveis que se reposicionaram de maneira exemplar, somando todos os esforços para atuar de maneira ética, cuidando dos seus colaboradores com responsabilidade e alinhadas ao seu propósito.
Por outro lado, as empresas são movidas por pessoas, e, neste aspecto, é importante que a recíproca seja verdadeira, isto é, oferecer segurança não é uma prerrogativa exclusiva do CNPJ. Talvez estejamos naquele momento crucial em que não há espaço para decisões equivocadas, portanto, devido à importância da situação, é relevante considerar a constância de um diálogo aberto e que priorize a serenidade e clareza nos objetivos comuns.
*Ozires Pereira de Oliveira é gerente de Serviços no Instituto das Cidades Inteligentes.